Processos de criação neológica
Você já viveu aquela situação de querer dizer algo, mas faltar a palavra certa? Daí vem aquela referência e você mistura ideias formando um novo termo. Nesse momento, você acabou de produzir um neologismo. E se misturou eco com sexual, formando ecossexual, ou medo com metro, formando medômetro, você fez compostos neoclássicos, pois eco e metro são partículas de origem grega. Poderia usar partículas latinas também que o resultado seria um composto neoclássico.
A formação de palavras novas acontece de forma natural entre os falantes de uma língua. E isso é para atender a necessidades de expressão e nomeação de coisas e sentimentos. Seria muito difícil para nossa memória usar palavras diferentes para atender a todas as situações de comunicação de uma língua. Assim, o processo de formação das palavras possibilita maior eficiência na nossa comunicação.
A renomada linguista Margarida Basílio diz que alguns dos motivos para formarmos novas palavras são a “utilização da ideia de uma palavra em uma ou outra classe gramatical; e a necessidade de um acréscimo semântico numa significação lexical básica”. Difícil? Vamos lá: o que ela está dizendo é que queremos transformar um verbo em substantivo, por exemplo; o segundo motivo seria a necessidade de criar um novo sentido para uma palavra já existente.
Nesse processo de reconhecimento do que é palavra temos os fenômenos de derivação e composição. Margarida diz que “o processo de derivação se caracteriza pela junção de um afixo a uma base para a formação de uma palavra”. Já “o processo de composição se caracteriza pela junção de uma base a outra para a formação de uma palavra”.
Nos interessa aqui tratar dos compostos neoclássicos formados a partir de radicais de origem latina ou grega, como já explicamos lá no começo. Nos compostos neoclássicos, o processo de formação se dá pela junção de bases presas, ou seja, que não funcionam isoladamente. Para deixar mais fácil: as bases são aquelas partes da palavra que não mudam. Por exemplo: em “eu falo”, se eu tirar a vogal que mostra quem está falando (o) vai ficar a base do verbo que é (fal). E assim por diante.
Essas composições são de grande produtividade na linguagem formal devido à necessidade de criação de novas nomenclaturas nos campos científico e tecnológico e filosófico-literário. No exemplo abaixo de publicação da Revista Galileu, houve a junção de nano (do grego nánnos) + a palavra corpo numa manchete científica.
Uma das características dessas composições é o que chamamos forma presa, que não muda, aparecer sempre numa posição pré-determinada, ou seja, ou está na borda esquerda, como nas palavras ecossexual e ecossocialista, ou na borda direita como em LGBTQI+fobia e em aracnofobia.
Outra característica é que essas partículas são formas livres nas línguas de origem, mas são presas nas línguas que as tomam emprestadas. Um exemplo é a partícula logos que tem sentido completo em grego, mas que precisa estar junto com outra base para ter sentido em outras línguas: tetra + logia.
Em neologismos como afropatys e afromauricinho, publicados na manchete da Folha de São Paulo, abaixo, vemos mais uma característica dos compostos neoclássicos: o desligamento do significado estrito dos elementos formadores da composição. Vixi, deu ruim? Vamos explicar: o termo composto não tem necessariamente a ver com o que está escrito, mas abre uma nova interpretação.
A última característica que queremos destacar é que essas composições estão conectadas por vogais sem vinculação à base da direita ou à da esquerda (aracn-o-fobia).
Por fim vale destacar que os neologismos podem aparecer das mais diferentes formas e vão sendo introduzidos na linguagem falada e escrita de maneira espontânea, a partir da criatividade e necessidades dos falantes. Memecracia, como posto no jornal El País, remete ao poder dos memes na atualidade. E demonio-cracia é um neologismo que surge como título de um livro pra falar de uma situação político-social.
E você, já fez um neologismo? Comente aqui no blog e deixe seu exemplo.
Esse texto foi desenvolvido por Sueli Checon de Freitas e Bruna Bragio Gonçalves,
alunas da disciplina de Morfologia do curso de Letras/Ufes 2023/2.
Para escrevê-lo, consultamos os seguintes textos:
A morfossintaxe da composição neoclássica (NOBREGA, V. A) e Teoria Lexical (BASÍLIO, M.).
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